terça-feira, 6 de maio de 2014

Somos todos macacos!

A casa está um caos.
A casa é o mundo e há lixo por todos os cantos, não só aqueles que vemos jogados pelo chão, porque eles são apenas o reflexo do que há por dentro das pessoas.
Todos podres, fétidos e desesperados.Caminhando sozinhos com destino a lugar nenhum, perdidos e iludidos pelos outdoors bonitos com pessoas sorridentes a caminho do shoppping.
A felicidade é líquida, estampada nas camisetas de marca que são parceladas em quinze vezes enquanto falta educação, falta saúde, falta dignidade. Falta tudo! Arroz, feijão e cultura.
Falta amar, falta olhar, falta prestar atenção, falta coerência, falta viver de verdade, enquanto a falta que mais nos preocupa é a que o juiz apita no gramado.
Uns andando de avião, enquanto outros dormem em caixas de papelão. Casacos de pele para uns enquanto o frio,  cortante, mata cruelmente nas ruas uns filhos da puta que nunca tiveram nada além da maldita caixa de papelão e os restos dos quais se alimentavam quando tinham sorte.
É tudo uma coisa só! Desigualdade, desliberdade, desjustiça, desafeto, desamor, desinteligência!
O que vocês estão fazendo com o mundo, que também é meu?
A podridão se espalha e corrompe cada dia mais e mais, e você, cego pelo brilho do ouro que lhe ofusca a visão, nada vê e com nada se importa. Se farta no confortável sofá em frente a televisão enquanto seus irmãos morrem pelas ruas sem o mínimo. Não te importa, você não vê, e eu? Sou só mais uma "filhinha de papai que quer mudar o mundo", "é só rebeldia", "quando crescer passa". Vocês não vão me ganhar, não vão me apodrecer.
Eu ainda vejo, eu ainda sinto, eu ainda sofro por baixo da casca  intitulada "se importar demais vai te deixar louco". Que eu enlouqueça, caramba! Ser louco em um mundo onde os sãos constroem armas de destruição em massa é um privilégio!
É uma realidade. Nós vivemos a era digital, século XXI, a era das revoluções na frente do pc, do politicamente correto, da demagogia, da burocracia, da falsa ideologia... Que ironia!
E eu aqui, querendo abraçar o mundo, enquanto as pessoas querem carros caros e motos barulhentas... E outras só querem ter o que comer, onde viver. Querem viver!
Saúde não tem, o médico é o vilão. Corredores lotados e o chão vira maca, a recepção vira sala de parto e você aplaude da platéia sem perceber que está no centro do picadeiro. E o palhaço é você!
Pseudo-intelectualizados, cantam o hino dos coxinhas. "PT - Petralhas"e nunca vão esquecer do mensalão, enquanto o tucanoduto não lhes chega nem à ciência. Votam errado, votam por brincadeira, votam porque os pais acham esse ou aquele, o melhor candidato... O menos pior!
"Democracia representativa", a melhor piada da história da humanidade vence qualquer pegadinha dos programas de domingo, mas as pessoas ainda não perceberam. Analfabetos funcionais.
Não sabem ler, não sabem ouvir, não sabem ver. São bonecos, robôs, múmias... Engessados pela hipocrisia que rege a sociedade moderna. Ativistas de facebook.
Segregacionistas, racistas, machistas, populistas, individualistas. Artistas da vida cotidiana cuja estrela principal é sempre "eu". O umbigo nunca foi tão grande e a cabeça, tão pequena.
Fios por todos os lados nos conectam com o outro lado da Terra, mas não conseguimos nos conectar com alguém à nossa frente. Não se olha mais nos olhos, não se vê as lágrimas e cada um que chore escondido no seu próprio lençol, porque a vida é uma festa na piscina à cinco dólares a entrada, denominada Instagram.
Vitimização em massa e culpabilização da vítima. Onde vamos parar?
Já paramos. Paramos de viver e nos tornamos uma maravilhosa paleta com 50 tons de cinza brilhantemente reproduzida no céu de São Paulo.
Tempo é dinheiro em uma época que se perde cerca de duas horas por dia em deslocamento casa-trabalho/trabalho-casa. Mas trabalhe bastante e pense pouco, porque incapacidade mental é o óleo que faz girar as engrenagens enferrujadas da sociedade em ruínas.
Evolução pouco se vê, revolução é preciso, devolução das terras, da cultura, da humanidade!

Somos todos macacos!

sábado, 26 de abril de 2014

Quase Vinte e Dois.

Entre a TV ligada no mudo e o cinzeiro em cima do sofá, eu me recolho na solidão e mergulho na plenitude dos meu pensamentos.
Mais um ano se passou e eu parei por um minuto para pensar em algo... Divaguei um pouco e percebi exatamente o que eu deveria fazer no momento.
A idade bate, os amigos casam, se formam, o role se renova e eu agradeço por estar lá para ver tudo isso e pela oportunidade de poder passar aos mais novos, um pouquinho do que aprendi com os tantos irmãos mais velhos que ganhei quase dez anos atrás.
É hora de agradecer. Por tudo... Pela família imperfeita que eu não troco por nada, pelas oportunidades, pela chance de fazer a diferença na vida das pessoas. Agradeço por ser inteira(!), nunca fui alguém pela metade.
Eu amo MUITO, eu me apaixono MUITO, eu sofro muito também, mas "mar calmo nunca formou bom marinheiro".
Agradeço toda a proteção cujo motivo eu não sei bem, mesmo com todos os erros, tropeços, tombos eu sei que alguém em algum lugar olha por mim e me cobre com seu manto... E me segura em seus braços quando caio.
Agradeço por tantas pessoas especiais, por tantas pessoas queridas que aparecem no meio dos "bicos", por tanta gente de verdade (sem apas!). Por tanta gente que eu sei que pensa em mim e toda a energia boa que, de alguma forma, acaba chegando até mim por uma simples lembrança com carinho de alguém quando lembra de mim.
Agradeço a confiança que me é dispensada e a oportunidade de fazer parte do exército de pessoas que, mesmo com toda a desgraça e mal do mundo, não se rendem e não se perdem com a maioria. Não pagam fogo com fogo porque sabem bem quem são e não abrem mão disso.
Enfim, quase vinte e dois! Pouco?
Aprendi MUITO e aprendo cada dia mais. Não vim para pedir, só tenho a agradecer!

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Esquizofrenia.

Os joelhos doem.
As coisas já não são mais tão fáceis, a empolgação se foi, me deixando a sós com as dúvidas e o desgosto. A revolta causada por tantos motivos inomináveis e concretizados alimenta meus monstros pessoais, que se tornaram mais eu do que eu própria. Me abraçam, me apertam e me sufocam numa tentativa desesperada de alcançar a vida, que foi dada a mim, não a eles. Lá no fundo, escondida, há uma pequena chama, um pequeno pedacinho de eu que ainda crepita, resiste, aquece... Ilumina.
As crepitações são gritos surdos como os de um prisioneiro em uma masmorra que tenta mostrar a alguém, ao mundo, talvez a si mesmo que ainda está vivo, não foi vencido.
Começa a ficar difícil respirar.
Não respirar é como sentir um pedacinho da morte. Os pulmões, cansados, já não são como antes... Os velhos pulmões de vinte e dois anos deterioram-se cada vez mais na minha tentativa falha de preencher o vazio com fumaça.
Os olhos, às vezes, amarelam-se.
Sempre mantenho uma garrafa por perto, pois se nada der certo, a anestesia está acessível. Uns dias são mais difíceis que os outros, ainda que todos eles sejam, em seu específico grau, insuportáveis... Invivíveis.
Sinto meu fígado pedindo socorro, esmagado por coleções gordurosas. Esteatose é uma certeza.
Levo algumas facadas nas costas.
Filtração, reabsorção, secreção, excreção. - Falência renal - Hemodiálise.
Dos males, o menor, vez ou outra descem-me cálculos, dilacerando levemente meu uretér. A genética não ajuda. Mas a urina escurece-se notoriamente, quase alcançando a cor marrom cuja sentença é triste. Falência renal. (sigo rezando)
Estou morrendo! De novo!
De todos os órgãos, o que mais me preocupa é o coração.
Arritmia, angina, infarto, insuficiência cardíaca... Nada disso. O diagnóstico do meu coração é esquizofrenia!
Regido pela loucura, sua atividade favorita é fazer minha face entrar em contato brusco com o chão. Gosta do perigo, gosta de brincar com fogo!
Eu me queimo... Sempre. Tantas vezes que já quase não dói.
Se o coração é esquizofrênico, imagine a dimensão da insanidade da própria mente!
Entende tudo errado, entende tudo como quer, acha que todos são loucos como eu, faz tudo errado!
Primeiro quer, depois não quer, aí quer de novo. E chora, volta atrás, corre atrás, se organiza (na medida do possível), se realoca, se reanima, se transforma, se desespera... Foco!
Organiza - faz acontecer.
Acontece! Aí não quer mais... Para depois querer de novo.
Nessa dança maluca da vida, nunca perde o rebolado, menos ainda a habilidade de se transformar, jogando fora o que já não serve.
Se tem algo que eu não sei, tampouco quero é andar na corda bamba da eutimia.
Quando não há variações, altos e baixos, é porque não há vida.
Tô bem viva!

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

No precipício

Já era quase uma da manhã, esfriara bastante depois do sono dos justos, como ela costumava dizer. Um cigarro, um café e uma ciatalgia, das horas e horas dispensadas na cadeira desconfortável em frente ao computador.
— Eu não devia fazer isso. Eu não devia mesmo.
— O que?
— Me perder.
— Mas você sempre foi perdida. Se perder, no seu caso, seria se achar.
— Não seja tolo! Não estou falando da bebida, do cigarro, nem da erva ou meu caos pessoal. To falando de me perder em alguém.
— Oh! — Ele disse, lançando aquele olhar cheio de significado, que ela tanto odiava.
— O que? Que foi, agora? — Perguntou, ríspida. Bufando, eu diria
— Nada...
— Não me irrita, ok? Eu estou à beira de uma crise, sentada no precipício. Na berada do poço cheio de merda que eu mesma caguei!
— Meu deus! Quanto drama!
— É sério, ok? Se você puder me segurar, eu agradeço. — Disse, com um certo tom de desespero — De que adianta ter um terapêuta particular, se ele trata sua insanidade como drama?!
— Tá, tá... Calma! — Exclamou, pegando uma caneta e um bloco de notas.
— Você tá de brincadeira com a minha cara, né? — Gritou, impaciente.
— Você acabou de pedir por uma sessão de terapia!
— E você sabe que não foi isso que eu quis dizer! — Interrompeu
— Foi sim. Foi exatamente isso. — Disse ele, sereno. — Você não precisa que eu seja seu amigo e diga uma série de baboseiras do tipo “você é como é e é isso que importa” ou “tudo vai dar certo”. Você odeia esse tipo de coisa.
Ela se recostou na cadeira, acendeu um cigarro e ficou com aquele olhar vago de quem tem tantos pensamentos turbilhonando, que não consegue externar sequer um.
— Caminhe para a luz, Miss Bagunça. — Ele disse, estalando os dedos.
— Muito profissional, você! — Reclamou, indignada.
— Não seja rude, eu te amo. — Falou com um tom terno — Agora me deixa te segurar. Comece me falando sobre “se perder em outra pessoa”.
Ela se perdeu nos pensamentos, novamente.
Ele já vira aquele olhar um milhão de vezes, mas não se cansava dele, ainda mais quando era acompanhado de um sorriso bobo, como agora.
“Se perder não pode ser uma coisa boa, sabe. Mas, incrivelmente é tudo o que as pessoas querem: achar alguém para se perder.
Mas eu não. Eu sei o que acontece depois, eu sei o quanto sou desprezível. Sei que tudo desmorona no final e a tendência é que eu me estabaque no chão, levando para casa, cerca de cento e cinquenta fraturas expostas que levarão mais um bom tempo de internação, requererão repouso e têm péssimo prognóstico.
São muitos calos ósseos, sabe. Quanto mais você tem, mais difícil é quebrá-los de novo. Mas eu não.
Ah, eu sou mestre na arte de me fuder e fuder as pessoas ao meu redor. Você é meu irmão, sabe muito bem disso.
Onde eu estava? Ah! Se perder... Desculpa, me perdi.
Se perder em alguém é pular do precipício. Poucas pessoas valem a pena e eu confesso que achei que não encontraria mais nenhuma... Até encontrar.
Um amor sereno, sim. Nada flamejante, como costuma ser.
Ah, cara! “Eu sou tão madura, tão racional... Tão sem graça.”
Gosto mesmo é da queda, de sentir meus cabelos voarem, o vento me abraçar e a sensação de que aquilo é a última coisa que eu vou fazer. Cada milésimo de segundo dura uma eternidade e o coração (inconsequente, ele), recebe o mais puro sopro de vida, vindo da descarga infindável de adrenalina, que faz ele pulsar forte e rápido, como alguém que grita suas últimas palavras: TUM-TÁ!
Não se pode estar mais vivo que isso. Turbilhona sangue por todo o seu corpo, você se sente pegando fogo, quente, vivo!
... E aí depois morre.”
— Tô te achando bem viva.
— Shh! Não me interrompe. Estou construindo algo aqui.
— Vejamos.
“... E morre. Tá morto. Mortinho. Apático, insosso, cinzento, desiludido e crente de que a vida é melhor assim. Tá tudo certo no país do eletrocardiograma horizontal. A vida é uma maravilha em tons de cinza — Por favor, não me interrompa para falar daquele livro nauseante — Mas o Universo é uma coisa engraçada, que quer ser notada e, (in)felizmente, me notou.
Eu estava lá, quietinha no meu caixão, cultivando amizades não-saudáveis e conversas corriqueiras, como sempre fiz e... BAM!”
— BAM?
— É.
— Como BAM?
— Olha, eu sei que eu roubei uma parte do Q.I. que deveria ir para você, mas você precisava ter cultivado o pouco que sobrou, sabe.
— Apedreja esta mão vil que te afaga! — Disse ele, dramatizando a cena. — Fale sobre o BAM.
Ela abriu uma garrafa de vodka e jogou um pouco no copo.

— Não posso, to caindo.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Solidão e cigarros;

Me afundo em cigarros na solidão do meu apartamento. O vento sopra gelado, arrepiando minhas pernas despidas, gelando meus pés... De repente, percebo que a solidão não está no lugar. A solidão me acompanha, aonde quer que eu vá, ora como uma velha amiga, que há tempos não encontrava, ora como aquele parente inconveniente que te invade a casa nos momentos mais inoportunos.
A solidão me ronda, me atinge, me deprime, mas me embebeda, me arranca sorrisos e até mesmo gargalhadas. Pego em sua mão. 
Caminhamos juntas pela rua deserta em direção ao horizonte, sem hora marcada para a despedida. O horizonte pode estar mais próximo do que parece... Ou mais longe do que eu jamais desejei.
Não sei se nada disso importa, nem sei se quero saber.
Dias atrás, me peguei buscando respostas sobre o futro... Foi quando ouvi aquela voz suave que vem de dentro, e dizia mais ou menos assim: “Amanda, mesmo com todos os truques e todos os dons, não se pode prever o futuro, porque ele muda a cada segundo. E quão chato seria se você soubesse? Ah! Se eu bem te conheço, você morreria de tédio!”
É, eu me conheço bem. Mas quem precisa de companhia, com uma mente tão auuto-suficiente quanto essa? Haha

Sigo aprendendo a desfrutar da minha companhia, pondo a casa em ordem, as idéias no lugar... Que lugar, Amanda?! Você não tem um só parafuso no lugar! Hahaha

sexta-feira, 5 de julho de 2013

Ainda é cedo.

“Falamos o que não devia nunca ser dito por ninguém.”




Eu abri a garrafa como se a tivesse encontrado no meio do deserto. Era uma miragem? Poderia ter sido.  Aquilo tudo, bem que podia não passar de um sonho trágico. 
Olhei meu braço. Ainda estava roxo. Cada vez mais escuro... Era real.
Me perguntei mais uma vez o que me deu na cabeça quando saí de casa como um cão raivoso.  E eu poderia até pregar aquele discurso de “eu não sou disso”, mas eu sou bem disso. Não foi a primeira vez, e com certeza, não será a última.

Eu sempre bebo, e isso me acalma. Mas eu não bebi. Eu não dei sequer um trago no cigarro!
Marchei em direção à casa dele e entrei ruidosamente pela porta, como se tivesse um mandato. Ele se assustou, acho que ficou esperando a voz de prisão. Foi até engraçado.
Eu pude ver várias luzes se acendendo pela vizinhança, enquanto eu berrava dentro do trailler.Eu berro, tu, eu já não sei, mas ele berrava bastante também. Não deu explicações, não pediu desculpas, só fazia arremessar na minha cara tudo o que eu havia feito errado em toda a minha vida.


— Como se você fosse santa! Já bebeu quanto hoje? Quantos maços já fumou? Você pensa que eu não conheço sua história? Acha que eu não soube de todas as malditas vezes em que você não dormiu sozinha? Eu sempre soube! Cada vez que eu entrava naquele bar, eu torcia, eu quase rezava para que, só por hoje, ninguém viesse me falar de você, contar algo. Não foi um amigo só que eu perdi por sua causa! Por sair no braço, depois d’ele me contar uma história sua, que eu sabia que era verdade! Agora você mexe esse seu rabo, da sua casa, até aqui, desce o pé na porta, acorda a porra do bairro inteiro, para me cobrar algo? Eu já aturei muita coisa sua, porque sei que isso tudo é culpa do seu pai blá-blá-blá-blá... 

Foi assim que eu ouvi. Ele teve a coragem de falar do meu pai!
(Meu pai era o alcoólatra que eu mais amava no Universo. Isso basta.)
Eu não sei bem quanto tempo se passou, mas quando me dei conta, o vinil do Black Sabbath já estava partido em dois e voando, sem escalaS, para a cara dele. Ele não desviou, ele nem piscou. Deixou que as duas metades daquilo que fora seu maior tesouro o atingissem em cheio.
 Saiu um pouco de sangue, quando um dos pedaços pontiagudos provocou um pequeno corte.

Tão rápido que eu quase nem vi, ele veio até mim, O meu braço agora estava sendo esmigalhado em suas mãos, e ele me olhava tão de perto e tão intensamente, que eu tive medo. Ainda assim, mergulhei naquele olhar... Havia fogo.
Por um instante, eu pensei que ele ia me matar.  Mas quando eu menos esperava, ele aproximou lentamente seus lábios dos meus... Quanto mais me beijava, mais forte o apertão que dava em meu braço ficava... O resto é previsível.

Olho mais uma vez para trás. Ele ainda está na cama... Me olhando e sorrindo gentilmente, enquanto eu acabo com a garrafa de whisky que lhe dei de aniversário.

terça-feira, 4 de junho de 2013

Vesgo do diabo;

Ela acordou, mais uma vez, sem ter idéia de que horas eram, mas não se preocupou o seuficiente para levantar da cama. Ficou lá deitada, pensando nos caminhos incertos que ela estava tomando.
Só foi capaz de sair de seu  labirinto de pensamentos quando seu corpo pediu algo: nicotina!
Uma pé na frente do outro. Ainda um pouco embreagada de sono, foi até a sala, abriu a porta e se sentou em frente ao computador. Ela esperava algo. Caralho! Era o último cigarro!
Fatalmente, ela teria que sair do seu mundo e mergulhar raso no mundo físico, e cigarros eram o melhor motivo que se poderia haver! Então ela vestiu a primeira roupa que encontrou jogada pelo chão do quarto e foi... Foi... Mas não foi. Nunca tinha ido! Seus pensamentos eram a armadilha mais traiçoeira. Uma espiadinha só, e de repente estava amarrada dos pés à cabeça!
Vá com calma, criança! Ninguém vai muito longe assim. A cabeça não aguenta.
— Será que eu quero aguentar? — Deu um sorriso de canto de boca.
— Se você tentasse fugir da sua mente com o empenho que foge dos assuntos sérios, talvez conseguisse...
— Você está ficando senil, sabia? Como eu poderia fugir de mim?! — Disse, deixando bem claro quão pouco sentido fazia para ela.
— Não adianta você sair andando... Eu posso estar “senil”, mas ainda posso andar!
— Eu não quero ouvir! Estou cansada disso! Já não me basta toda a bagunça da minha vida? Só o que me faltava era um velho louco, me dando conselhos sem sentido, no meio da rua!
— Pode esperniar o quanto quiser! Eu não vou deixar você cair. — Falou, afetusamente.
— Vesgo do diabo. — Afirmou, enquanto parava no meio da rua e olhava para ele.
Ele franziu as sobrancelhas, procurando o sentido do que acabara de ouvir. Depois sorriu, deixando claro que compreendera.
— Não há como cair, se você está preso... — Explicou, com aquele tom sábio que só os velhos conseguem dar às frases.
— Exatamente!
— Se já sabe em que está, já sabe como se livrar! — Provocou.
— Luz...
Ela começou a entender o que ele queria...
— Luz! Você encontrou a solução, querida! — Disse, tão pacificamente quanto poderia, antes de se virar e sair.
— Espera! Porra! É só isso? Você vem, joga o maior papo... Diz “luz” e vai embora? Que diabos, quer dizer “luz” nessa metáfora?
Ele não estava mais lá... Ele nunca esteve.
— Tenho certeza que vai descobrir!
Ela virou-se, para procurá-lo. Foi quando notou que as pessoas que estavam paradas a alguns metros dali direcionavam-lhe olhares assustados e confusos.
— Velho filho da puta! — Ela xingou baixinho, antes de pôr o capuz da blusa e sair andando como se nada tivesse acontecido, com um sorriso na boca...
Cigarros! Ela se lembrou o que fora fazer...